Pé de bofete
           
            Os pirralhos brincam com as bolas de meia e com as mais variadas bolas de borracha. O campo de atuação é a rua Piragibe de beleza incomum, numa aquarela de ladrilhos em paralelepípedos, casas coloridas e casas comerciais de personagens bastante conhecidos.
            Os pirralhos Lando e Tota são verdadeiros fujões das suas casas para bater aquela pelada e controle com as bolas artesanais e de feitio industrial.
           Certo dia, Lando dá um pitu em sua irmã Mitucha e carrega sua bola de couro de voleibol. Sai em disparada que nem trem bala para a casa de Tota. Chegando lá, e alvoraçado, grita:
            - Tota! Tota! Vamos bater aquele controle com uma bola de couro!!!
            Tota abriu a porta, arregalou os olhos e ficou radiante com aquela linda bola de couro, e fala:
            - Lando, que bola arretada! Vamos dar um espetáculo de futebol na rua!!
            Assim, caminham para a bela rua a qual é o palco para apresentar os seus verdadeiros dotes de atletas do futebol. O local escolhido é o em frente a Drogaria Orlando Xarope. Iniciam o controle com os pés e com a cabeça, e no final aquele chute a meia altura carimbando aquele lindo gol...e gritavam alegres e contentes a feitura do gollllllllll. Em um certo momento, Lando grita para Tota:
            - Faz o gol, centroavante Tota!
            Foi uma bolada que subiu a uma altura de três metros indo atingir a placa nova da Drogaria Orlando Xarope. A placa de moldura em madeira e de vidro cai e se desmancha toda. Lando grita!
            - Tota e agora?
            Tota reagiu numa tremedeira quase dando um ataque cardíaco, e aconselhou a Lando.
            - Vamos correr pra casa e nos esconder!!!

            Assim o fizeram. Foi um alvoroço a chegada dos pirralhos em suas casas. O mais nervoso, o Tota, quando adentrou em casa, sua mãe Arilete foi logo perguntando.
            - O que você fez menino treloso, metido a jogador de futebol!!!???
            Ele respondeu aos prantos:
            - Quebrei a placa da drogaria do seu Orlando Xarope!
             Dona Arilete, tomada de uma raiva, foi logo avisando:
             - Tu vai resolver com teu pai quando chegar. Vai pra peia.
             Lá pras tantas o pai do Tota chega. O fuxico começa. Dona Arilete faz logo o inferno daquele atleta mirim.
             - Zé Papai Noel, o teu filho desastrado deu um bicudo em uma bola que quebrou a placa novinha do seu Orlando Xarope.
            Zé Papai Noel arregala os olhos e parte para o quarto onde está seu filho. Tota por sua vez, está acuado e tremendo mais do que vara verde de bambu no canto de sua cama. Sabendo que seu pai não o chama pelo nome, e sim de Sinhô, tá lascado – vai levar uma surra de cinturão.
            Já no quarto, Zé Papai Noel se dirige ao seu filho Tota e fala:
           - Sinhô menino bom, só dá prejuízo. Levante-se pra apanhar!
            O menino Tota levou umas boas lapadas de cinturão de couro grosso e trabalhado, que o fez cair em prantos e se mijar dando um novo colorido ao seu calção de atleta. Eita mijadeira!
           Por conseguinte, Zé Papai Noel amarrotou toda a sua roupa de linho branco e desalinhou a sua vasta e alva cabeleira, sem contar que o seu anel de ouro com a esfinge de São Jorge quase salta do seu dedo indicador.
            Todos refeitos. Zé Papai Noel chamou seu filho Tota.
            - Vamos agora na drogaria do seu Orlando Xarope para acertar o prejuízo.
            O menino Tota quando ouve o chamamento quase se borra novamente. Aquilo era um calvário. E lamenta pra ele mesmo – eu tinha nada que acompanhar Lando nesse controle, e ainda vou enfrentar a fera do seu Orlando Xarope.

            A chegada na drogaria é de muita cordialidade entre Zé Papai Noel e Orlando Xarope. Tota por sua vez com os olhos esbugalhados e inchados de tanto chorar, reza o pai nosso em silêncio e de carreirinha que até a máquina de calcular emite a expressão, “error”. A conversa entre os adultos vai numa boa quando Zé Papai Noel passa a narrar o acontecido:
            - Amigo Orlando Xarope. O meu filho Tota jogando futebol em frente a sua drogaria deu um bicudo na bola que acertou em cheio sua placa nova, ou melhor, quebrou a placa.
            Seu Orlando Xarope, com seus óculos no final do pau da venta, olha e encara Tota como fosse seu algoz e carrasco para lhe impor uma nova pena - castigo a abstinência da bola de futebol. Tota numa tremedeira descontrolada já sentia a cabeça rodando num avançado estágio de síncope, começa a chorar e soluçar pedindo desculpas ao seu Orlando Xarope. Por sua vez, o farmacêutico com aquele vozeirão fala.
            - Tota, meu filho! Que chute da moléstia dos cachorros foi esse – desmontou até o ferro da placa? Não vou cobrar nada de seu pai – somos amigos!
            Em seguida seu pai agradece ao seu Orlando Xarope, como também o pirralho Tota. E Tota como bom menino até a mão do dono da drogaria passa a beijar.
            De repente, quando Tota desce o último degrau da entrada da drogaria escuta o vozeirão de seu Orlando Xarope.
            - Menino venha aqui novamente!!!
            Tota se vê apertado no querer de dar uma carreira pra casa, mas obedeceu.
            - Pois não seu Orlando Xarope.
            Seu Orlando Xarope com a faceta de apelidar a todo mundo abre o sorriso e fala:
            - Tota, eu estava a olhar seu pé...é bem crescido e tem força, você não deve usar chuteira e sim uma luva de boxe, pois possuis um pesado petardo pé de bofete!!!
           
Em 26/10/2016

Soares, Lourenço Adolfo Ferreira

Comentários