O jornal mais antigo da America latina (Diário de Pernambuco) publicou em sua coluna de opiniões, uma crônica maravilhosa sobre o nosso "Rei do Brega" - Reginaldo Rossi, a qual este blog tem a satisfação em publica-la.
REI DO BREGA: Rossi pediu a conta. E a nossa saudade vai pagar.
Rei do Brega universalizou a boemia, democratizou a roedeira, embaralhou dores e amores.
REI DO BREGA: Rossi pediu a conta. E a nossa saudade vai pagar.
Rei do Brega universalizou a boemia, democratizou a roedeira, embaralhou dores e amores.
Arte:Jarbas/DP
A
cadeira está vazia. A conta, encerrada. O copo, emborcado e saudoso do dono. O
uísque com Coca-Cola repousa no passado. O garçom continua atento às lamúrias,
a todas as confissões. Mas o silêncio prevalece. A voz do ídolo se calou.
Reginaldo Rossi morreu. E a dor, tão cantada por ele em paixões, desamores,
traições, abandonos e lamentos, agora serve à tristeza pela partida súbita do
ídolo.
Pobre, de origem humilde, dono de uma cabeleira bem brasileira, Reginaldo Rossi
reunia todos os aspectos desprezados por uma indústria do show businness ávida
por sinais de perfeição. O sucesso conquistado de forma gradativa, no entanto,
demoliu prováveis empecilhos à trajetória artística.
A performance no palco, as brincadeiras, músicas e referências sexuais sem pudores
pavimentaram o apreço de públicos e artistas de gêneros musicais distintos.
Querido do rock ao sertanejo, do forró ao mangue beat, ele arrastou da cozinha
para a sala de estar o brega apedrejado publicamente, mas vivenciado às escuras
nas noites, nos bares, na rotina por vezes indescritível. Sobre o palco,
desfiou as metades da alma humana. As dores mais renegadas da traição, da
desilusão, da saudade e da paixão bandida. Os sabores mais desejados dos
amores, das conquistas, da beleza e da vida. Ignorou recortes e costumes.
Quebrou barreiras sociais e econômicas. Entrelaçou ricos e pobres, mulheres e
homens em torno de letras e composições. Foi o homem de chinelo no pé, na
mansão ou no barraco.
Passeou por sentidos e sensações. Exaltou o Recife, encantou Itamaracá,
decifrou a raposa, seduziu mon amour. O mundo visto e o sonegado, nas
linguagens cabíveis ao sentimento. Universalizou a boemia, democratizou a
roedeira, embaralhou dores e amores. Nas brechas do preconceito, inverteu o
rótulo de brega e se fez porta-voz de um gênero marginalizado por cantar o que
todos vivem. Abriu a camisa e as mentes, exibiu os pelos e as contradições
entre gosto e discriminação, dispensou a meia dos sapatos e desnudou um Brasil
doido para se ver e mostrar.
Foi rei da simplicidade. Descartou a intelectualidade da língua, preteriu
construções rebuscadas, desprezou o afago à crítica. Falou o idioma do plebeu.
Em inglês, francês, árabe, japonê, errado, torto e certo. Necessário. Tomou
emprestadas expressões do cidadão comum, deu vida aos dilemas das massas,
tornou poesias as desventuras de qualquer coração. Fez-se cara, história e
sentimento do povo.
Mas os óculos escuros, parceiros de toda sorte, estão órfãos. No balcão, sobra
o vazio. Palco e microfone se enchem de ausência, da partida sem hora para
voltar. Os fãs, chifrados pela morte, encaram o gole amargo da despedida. E nem
adianta lamentar. Rossi pediu a conta da vida. E, com muita saudade, todos nós
vamos pagar.
Thiago Barbosa
Publicação em 21/12/2013 - às 10h28min - Diário de Pernambuco
acesso: 21/12/2013.
Comentários
Postar um comentário