Tecnologia
inédita no País varre todo o lixo do Rio para cima do tapete
Central de tratamento que protege
solo com manta de polietileno passa a receber as 7 mil toneladas diárias do
lixão de Gramacho.
Valmir Moratelli,
iG Rio de Janeiro
Foto J.Egberto
Manta de polietileno protegem o solo na CRT Seropédica
Esqueça as montanhas de lixo escaladas pelos
catadores que disputaram por décadas espaço com porcos e urubus em Jardim
Gramacho, na Região Metropolitana no Rio. Com o encerramento das
atividades do aterro em Duque de Caxias, marcado inicialmente para a próxima
sexta-feira, mas adiado para domingo (3), todo o lixo produzido na capital
fluminense passará a ter como destino final a Central de Tratamento de Resíduos
(CTR), em Seropédica.
A 75 quilômetros do Rio, a CTR começou a funcionar em abril de 2011, e vem
recebendo gradativamente os resíduos que iam para Gramacho e também Gericinó,
aterro de Bangu, na Baixada Fluminense. A nova central já recebe 6,7 mil
toneladas de lixo vindas do Rio diariamente.
Entre as principais tecnologias empregadas está a implantação da tripla
camada de impermeabilização do solo feita com mantas de polietileno de alta
densidade, conhecidas como “pead”.
Este imenso tapete cobre a parte inferior do
terreno, que também recebe sensores ligados a um software que indica o ponto
exato de um possível vazamento de chorume, o líquido tóxico proveniente da
decomposição do lixo. A reportagem do iGesteve em
Seropédica para ver de perto esta nova maneira de dar um fim ao lixo urbano e
domiciliar.
“É o primeiro centro de resíduos da América Latina. Igual a este só nos
Estados Unidos, e mesmo assim lá eles usam esta tecnologia apenas em aterro de
resíduos industriais. Nós implantamos aqui, em aterro de lixo urbano. É um
cuidado redobrado que estamos tendo no Rio”, conta Priscila Zidan,
superintendente de operações da CTR, administrada pela Ciclus, uma empresa
privada.
Foto: J.Egberto
Depois da proteção do solo, no lixo passa a ser depositado em níveis de cinco metros de altura
Montanha
de 100 m de lixo
Conforme explica a
superintendente de operações, antes da CTR entrar em funcionamento, foi feita
uma aplicação de um metro de camada de argila no solo primário da região. Em
seguida, foi estendida uma primeira manta de polietileno, a “pead” de 1,5mm de
espessura, junto com um emaranhado de pequenos sensores ligados a uma central.
Após uma camada de areia drenante, outra camada de “pead”, de 2mm, e, por fim,
mais 50cm de camada de argila compactada (o que impede que máquinas e tratores
danifiquem o tapete de polietileno).
Só depois de todo este
tratamento é que o lixo passa a ser jogado sobre o solo. Cada camada de resíduo
tem, em média, 5 metros de altura. O limite máximo a ser alcançado com as
camadas que virão nos próximos anos é de 100 metros de altura. A previsão é que
se alcance esta meta em dez anos. A vida útil do atual espaço da CTR é de 17
anos, considerando as cerca de 7 mil toneladas de lixo que chegam ao local por
dia.
Energia no gás
O cheiro, entretanto, ainda é bastante desagradável. Já na entrada no
portão principal, por onde chegam mais de 300 caminhões 24 horas por dia, é
possível sentir o odor que vem da planície a alguns metros dali. O lixo vem de
“estações de transferência” espalhadas por diversas localidades, destino dos
caminhões coletores que circulam nos bairros da capital.
Tubos verticais são postos ao longo do terreno para coletar o biogás
que, futuramente, produzirá energia. De acordo com Priscila Zidan, o biogás é
composto por 50% de metano, sendo um dos principais poluentes gerados pela
decomposição do lixo. “Em breve este gás será transformado em ativo econômico.
O biogás pode ser levado a uma usina de geração de energia ou ser tratado e
purificado para ganhar propriedades semelhantes às do gás natural, para
comercialização. É o próximo passo”, diz a superintendente.
Ela explica que, para a geração de energia, o gás captado será levado
para seis geradores com capacidade de absorver dois mil metros cúbicos do gás
por hora. O aproveitamento bioenergético previsto terá capacidade de gerar 30
MW de energia quando o empreendimento estiver em pleno funcionamento, o que
corresponde à iluminação de uma cidade de 200 mil habitantes.
Sem
catadores
Assim que foi anunciada a
construção do CTR em Seropédica, moradores locais se revoltaram. Protestos
foram feitos diversas vezes às margens da BR-116. Havia o temor de que ali
fosse implantado um aterro parecido com o de Gramacho, às margens da Baía da
Guanabara. Com quase 80 mil habitantes, Seropédica não queria virar cópia de
Gramacho.
Edson Cardoso, analista de
responsabilidade socioambiental da central de Seropédica, acredita que a tensão
já se dissipou. “A geração de empregos nesta comunidade foi um divisor de
águas. Acabou aquele clima inicial de insegurança, quando viram o tipo de
normas ambientais que seguiríamos. A CTR ajudou, inclusive, a aquecer a
economia local, do pequeno empresário”, relata. Agnelo Júnior, supervisor de
operações, é um exemplo de aproveitamento de mão de obra local. “Além dos
ganhos com o meio ambiente, o Rio de Janeiro passa a ser exemplo aos outros
estados. Criaram emprego num lugar onde antes não havia muita coisa para se
fazer”, conta.
O terreno de 1,2 milhão de
metros quadrados tem 247 trabalhadores fixos, com carteira assinada. Nenhum
deles tem contato direto com o lixo. Todo o trabalho é mecanizado. O que é bem
diferente do que ocorria em Gramacho, onde 1400 catadores viviam, noite e dia,
à procura de materiais que pudessem ser reaproveitáveis.
Foto: J. Egberto
A lagoa de chorume é esvaziada diariamente.
O líquido é levado para uma estação de tratamento em Niterói.
Águas negras
Três lagoas artificiais foram construídas para receber o chorume
proveniente das camadas de lixo enterradas sob a grama. Tubulações subterrâneas
levam o líquido até as lagoas, que têm área de 2 mil metros cúbicos. Caminhões
fazem a retirada diária do chorume das lagoas.
Pretende-se, em breve, que ali mesmo seja feito o tratamento desse
resíduo líquido. Está sendo construída uma Estação de Tratamento de Chorume
(ETC), para transformar o líquido tóxico em água de reuso. A previsão é que
dois mil metros cúbicos do líquido serão tratados por dia em Seropédica. Por
enquanto, o chorume retirado das lagoas é levado para tratamento em Niterói, a
quase cem quilômetros da cidade.
O município de Seropédica recebeu este nome como antigo local de
fabricação de seda. Sua principal atividade econômica hoje é a extração de
areia para uso na construção civil. Com o lixo vindo de vários cantos do
estado, armazenado sobre tapetes de polietileno e escondido em verde grama, a
cidade ganha novo status socioambiental.
IG.
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